MARCEL PEREIRA

24 novembro 2006

Renda Fixa ainda é Rainha, mas está perdendo sua Majestade

É equivocada a visão de que foram os ajustes econômicos vividos pelo Brasil desde a implementação do Plano Real que impuseram a asfixia financeira sobre o setor produtivo. O cotejo entre a rentabilidade média das ações negociadas em bolsa e o retorno obtido na renda fixa, nos últimos trinta anos, prova que o período anterior à implementação do ajuste monetário era mais sufocante. Logo, o ajuste mostrava-se necessário, e haveria de pagar-se um preço por ele.
O cálculo desta rentabilidade busca explicitar a dimensão da perda de competitividade da atividade produtiva brasileira. O resultado mostra o tamanho das distorções da economia do Brasil. Nos últimos vinte anos, seu funcionamento esteve “de ponta cabeça”, sob uma lógica de funcionamento inversa à que seria normal em uma economia saudável: a aplicação mais rentável foi a que oferecia menos risco, e não o inverso, como reza a lógica econômica.
Resultado: com uma rentabilidade menor das ações frente aos juros pagos na renda fixa, não há como a indústria ser competitiva e multiplicar empregos. Sem crescimento, a indústria não ganha escala e perde competitividade. Acaba não havendo incentivo à produção. A economia, estando menos dinâmica, não funciona sob regras de competição que estimulem a queda no custo de seu produto final. O mercado de capitais acaba atrofiado, sem “fôlego” para financiar a atividade produtiva.
A indústria também perde competitividade internacional. O êxito externo só é possível em momentos nos quais há um eventual “boom” de preços no mercado internacional que compense esta distorção entre a rentabilidade dos ativos domésticos.Essa desproporção inverteu-se nos últimos anos. A rentabilidade do mercado de ações voltou a superar a da renda fixa. Só com a continuidade nos ajustes macroeconômicos será possível dar continuidade a este quadro, permitindo à economia perpetuar essa “normalidade”
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08 novembro 2006

Expectativas para 2007

A visão para 2007 é otimista, mas com precauções. Há muitas décadas o Brasil não começa uma gestão nova na Presidência da República sob tão baixa vulnerabilidade. A inflação está sob controle, a taxa de juros no nível mais baixo da história recente, não há um problema grave de déficit no balanço de pagamentos, a dívida externa caiu muito, a dívida interna recuou bastante como proporção do PIB e o salário mínimo voltou ao patamar em que se encontrava no final dos anos 70. O Brasil avançou muito na minimização do risco sistêmico de sua economia.
O “colchão de reservas” está cheio. A proporção entre exportações e dívida externa, um dos mais relevantes indicadores de risco soberano, que era de 5 para 1 em 1998, está em 1,2 para 1, patamar mais próximo ao de Chile, México e Rússia, por exemplo, todos três países que já obtiveram o investment grade. A participação de papéis indexados a câmbio na composição de sua dívida mobiliária foi zerada, os indexados à selic estão diminuindo e os prefixados aumentando sua fatia. Por conta do superávit primário, a relação dívida/PIB está perto de romper 50%. Tudo isto é muito bom, e todo este cenário tende a se aprofundar durante 2007, por isso o otimismo. Mas nem tudo são rosas. É um erro grave acreditar que o processo de ajuste macroeconômico já se concluiu e os problemas são coisa do passado. Este processo está ainda na metade do caminho. O quadro fiscal ainda é vulnerável. A inflação ainda pode voltar se o processo de reformas não andar. Se este processo não se concluir, equacionando-se o desarranjo fiscal, os desajustes externo, fiscal, monetário e de preços voltarão a médio prazo. Por isso, o país ainda não saiu da rabeira na escala de risco soberano. Está a dois degraus de obter o investment grade, patamar onde nunca antes havia estado, mas ainda na companhia de países cuja percepção de risco é alta, como Colômbia, Peru e Venezuela.