MARCEL PEREIRA

04 dezembro 2006

Crescer 5% depende da conclusão dos ajustes

artigo publicado no site www.viapolitica.com.br e na edição de dezembro da revista Brazilian Business
O fato mais relevante para a economia mundial em 2006 foi a conclusão do ajuste monetário na economia dos Estados Unidos. Entre 2002 e 2005, a taxa de juros foi mantida no menor nível já registrado na história americana, jamais permanecera tão baixa por um período tão longo. Isso proporcionou uma fartura de liquidez na economia global. E as principais economias emergentes aproveitaram o forte influxo de capitais estrangeiros para acelerar seu ritmo de crescimento.
O ciclo de alta na taxa de juros americana iniciou-se em julho de 2004, quando o nível de atividade interna estava aquecido e surgiu uma crescente ameaça de pressão inflacionária, imposta pela forte elevação no preço internacional do petróleo. O Federal Reserve iniciou então o processo de ajuste gradual dos juros, elevando a taxa em 0,25 ponto percentual a cada reunião. A fartura de liquidez foi gradativamente se reduzindo.
No começo de 2006, o núcleo da inflação ao consumidor dos Estados Unidos (CPI) – que exclui alimentos e energia – acumulava uma variação de 2,11% em doze meses. A taxa referencial de juros (fed target rate) estava estipulada em 4,25% (3,25 pontos percentuais acima do nível em que se encontrava em julho de 2004). Os juros fecharão o ano em 5,25% (apenas 0,65 ponto percentual abaixo da média histórica). O preço internacional do petróleo caiu bastante no segundo semestre, reduzindo a pressão sobre os preços. Entretanto, ainda paira uma ameaça de pressão inflacionária: o quadro orçamentário federal deficitário. Há algum tempo, os gastos do governo têm superado a arrecadação do Tesouro. Mais gastos significam mais transações, o que exerce pressão nos preços.
Uma outra ameaça paira sobre a economia dos EUA e é fator de risco para a economia internacional: os sucessivos déficits comerciais. Eles impõem maior dificuldade de financiamento externo. E, o que é mais ameaçador, podem significar um aumento da incerteza com relação à moeda americana. Os déficits gêmeos (fiscal e comercial) impõem o risco de que, eventualmente, bancos centrais de diversos países diversifiquem suas reservas internacionais, trocando o dólar por outros ativos (corrida contra o dólar).
Durante 2006, as incertezas quanto ao futuro político da União Européia amenizaram os efeitos de desvalorização da moeda americana. O euro oscilou durante a maior parte do ano entre US$ 1,25 e US$ 1,28. Em novembro, frente a uma crescente expectativa de nova desaceleração da atividade econômica nos Estados Unidos, a cotação do euro voltou a atingir US$ 1,30, seu maior patamar desde abril de 2005. O contraponto a essa ameaça de desaceleração da atividade, que paira sobre a economia mundial em 2007, é a manutenção de um forte aquecimento na economia da China, que tem pressionado a cotação de preços das commodities minerais e agrícolas. O gigante asiático superou as metas de crescimento colocadas pelo próprio governo. Crescendo a taxas de 10% ao ano, os chineses têm utilizado o mecanismo do comércio exterior para adquirir mais insumos.
Este cenário de elevação dos preços das commodities no mercado internacional, naturalmente, favorece os países que as exportam, dentre os quais destaca-se o Brasil, mitigando, em parte, o risco de menor fluxo de liquidez no mercado de capitais global. Isso permitirá ao Brasil manter em 2007 o processo de queda na taxa nominal de juros (a Selic deve fechar o ano em 12% a.a.) com estabilidade da inflação. A taxa de juros real brasileira ainda se mantém como a mais alta do mundo. E tem tornado o Brasil o destino preferido, dentre os emergentes, para os dólares que estão sobrando no mercado.
Em 2006, a valorização da moeda brasileira frente ao dólar provocou uma redução nos preços relativos dos bens comercializáveis (tradeables), trazendo duas importantes conseqüências para a economia: colocou a taxa de inflação abaixo do centro da meta e gerou estímulos às importações e desestímulos às exportações, prejudicando o saldo comercial no ano.
Contudo, mesmo com este desestímulo natural do câmbio, o valor exportado pelo Brasil cresceu, por conta de um efeito preço, já que a remuneração das commodities se elevou bastante. Houve redução no volume (quantum) exportado e crescimento do montante recebido (em dólares).
Para 2007, o baixo desempenho da economia nos anos anteriores fez o presidente Lula prometer publicamente que vai fazer de tudo para crescer 5% sem ameaçar a estabilidade. Nos últimos dez anos, a média de crescimento econômico do Brasil foi de 2,3% ao ano. Nos quatro anos da primeira gestão do presidente Lula (2003-2006), essa taxa foi de 2,7% ao ano. Nos próximos quatro, projetamos um crescimento médio próximo a 3,3%. À medida que vai concluindo o ajuste macroeconômico, equacionando o déficit fiscal, mantendo a inflação sob controle, diminuindo seu nível de endividamento e sua vulnerabilidade externa, o Brasil caminha rumo a um nível de crescimento mais acelerado. A equação final para um salto definitivo que lhe permitirá equilibrar estabilidade de preços e crescimento econômico depende, entretanto, do corte de gastos supérfluos e do equacionamento do déficit da Previdência Social, ações que lhe permitiriam a redução da pesada e onerosa carga tributária sem comprometer o resultado fiscal. É isso o que se espera da gestão reeleita.